Flávio Carneiro


Entrevistas


FLÁVIO CARNEIRO, O PONTA DIREITA QUE VIROU ESCRITOR
www.oglobo.com.br/blogs/prosa, 20/04/2009.
Entrevista concedida a Miguel Conde.


Antes de ser escritor, Flávio Carneiro era um promissor ponta direita. Aos 11 anos já jogava pelas divisões de base de clubes goianos, e aos 17 recebeu uma oferta de trabalho no Guarani de Campinas, que acabara de vencer o campeonato brasileiro.
A carreira esportiva parecia encaminhada, mas Carneiro resolveu apostar num caminho incerto: veio para o Rio de Janeiro estudar literatura, com a ambição de um dia virar escritor. Como exceção de um conto e um roteiro de curta-metragem, os dois jogos (da palavra e da bola) ficaram separados na sua vida, até 2007, quando ele começou a escrever crônicas mensais para o suplemento paranaense "Rascunho".
Nelas, recuperou experiências de jogador e de torcedor, e arriscou analogias entre futebol e literatura ao identificar o lirismo do futebol de Garrincha, o humor de Dadá, e o épico em Pelé. Os textos foram reunidos no livro "Passe de letra - futebol & literatura" (Rocco), que acaba de ser lançado.

Como começou sua carreira de jogador?
Comecei a jogar com onze anos, em Goiânia. Durante a juventude joguei em alguns times lá. Com 17 eu ia me profissionalizar para jogar no Guarani de Campinas, que tinha sido campeão brasileiro no ano anterior. Mas aí acabei optando por ir para o Rio, fazer o curso de Letras, escrever.
Você se considerava melhor escritor do que jogador?
Sempre achei que me dava melhor como jogador. Como escritor você leva muito tempo até sentir alguma firmeza. Para mim, ser um escritor era um sonho que estava lá na frente, enquanto ser jogador já era uma realidade. Só fui publicar meu primeiro livro aos 24 anos.
Alguma vez se arrependeu da decisão?
Eu por muito tempo me arrependi, sentia muita falta. Tem algumas crônicas do livro que falam disso. Hoje nem tanto. Há cinco anos eu jogo num time de veteranos aqui em Teresópolis. Então dá mais ou menos para enganar.
Qual era seu estilo no campo? Você jogava como ponta?
Pois é, na época ainda existia isso. Hoje o atacante joga em qualquer beirada do campo. Eu era muito veloz, e além disso tinha uma técnica que me diferenciava um pouco dos outros. Os atacantes da época ou eram velozes ou trombadores, especializados em fazer gol. Eu tinha um bom toque de bola, jogava no meio de campo quando precisava.
E dava para falar de literatura com algum dos colegas de time?
Na época, eu tinha uns dois ou três amigos que gostavam muito de crônicas de futebol: Nelson Rodrigues, João Saldanha. Eram os únicos contatos que eu tinha com quem gostava de ler. A literatura não era uma coisa que eu pudesse dividir com o pessoal do futebol. A conversa tinha que ser outra, o que para mim era tranquilo. Eu não era tão fanático por livros a ponto de não poder falar de outro assunto.
Você acha possível ver o futebol de maneira literária?
Acho que sim. Cada um faz a comparação a partir das suas vivências. Acho que é possível ver um estilo mais lírico no Garrincha, por exemplo. Um futebol que não tem a ideia de chegar a algum lugar, como normalmente a narrativa tem, mas brinca com a bola como se brinca com palavras. Já o Dadá Maravilha tinha uma coisa mais cômica, irônica, engraçada, quase farsesca. E o Pelé eu vejo como um grande épico, que fazia questão de criar em torno dele essa imagem do mito.
E geralmente você vê o futebol com esse olhar estetizado?
Quando tem jogo do Botagofo, é difícil. Quando é um jogo de um time que não me interessa o resultado, consigo acompanhar com prazer.
Qual foi o ponto alto da sua carreira de jogador?
Logo no início, ainda pela categoria Dente de Leite, a gente ganhou um campeonato goiano contra o Goiás, no campo do Goiás, e eu fiz os dois gols do time. Mas mais emocionante mesmo foi jogar no Serra Dourada. Jogamos uma preliminar de Goiás e Vila Nova com o estádio cheio. Perdemos de 3 a 2, mas eu fiz os gols. Foi uma experiência marcante.





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