Flávio Carneiro


Entrevistas


FICÇÃO 21
Correio Brasiliense, 11.06.2005
Entrevista concedida a Sérgio de Sá


O professor, ensaísta e escritor Flávio Carneiro acaba de lançar No país do presente: ficção brasileira no início do século XXI (Rocco), uma coletânea de 65 resenhas de romances, novelas e livros de contos publicados entre 2000 e 2004, de autores novos e consagrados. Alguns dos textos apareceram anteriormente em jornais do país. Foram três as perguntas feitas ao autor.
Que papel a crítica ainda pode exercer em tempos de dispersão?
O escritor argentino Ricardo Piglia dizia que a crítica é uma variante do gênero policial. Concordo com ele. Vejo o crítico diante do texto como o detetive diante de um enigma. A diferença é que o enigma do texto não tem uma única solução, o que torna mais interessante a aventura da crítica literária. Entendo o crítico, então, como um aventureiro que viaja pelos textos em busca de um segredo que, muitas vezes, não existe. Nesse sentido, o crítico se aproxima do ficcionista. Ambos devem saber que lidam com o risco, com a incerteza, e que o prazer que podem ter e transmitir ao leitor tem a ver com a busca em si, não com a chegada. Como aconselhava Borges: busca pelo agrado de buscar, não pelo de encontrar. Assim, a crítica e a ficção se sentem muito à vontade (ou pelo menos deveriam se sentir) em tempos de dispersão, de incerteza. A incerteza é a matéria-prima da crítica e da ficção, é dela que se alimentam, e portanto o ficcionista e o crítico deveriam se lançar de cabeça nessa aventura, tentando trilhar os caminhos possíveis em meio a esse bosque de caminhos que se bifurcam.
A ficção brasileira no inicio do século 21 está sintonizada com o início do século 21?
A ficção é sempre parte da rede mais ampla da cultura. Impossível não estar sintonizada com o ocorre à sua volta porque ela mesma, ficção, ajuda a construir o que está em torno. A meu ver, o que se manifesta como, quem sabe, uma marca diferencial do século que se inicia é sua capacidade de dialogar com o passado, de retomá-lo de forma crítica e inventiva. Ao contrário do que se dava, por exemplo, na virada do século XIX para o XX, quando havia um clima de combate ao que parecesse velho, atrasado, e a palavra de ordem era: futuro. Hoje percebemos que há uma rica vertente na retomada de antigos modelos e a ficção produzida atualmente no país está atenta a isso, dialogando com a tradição não para negá-la mas para recriá-la. O escritor brasileiro, hoje, sabe que escrever é também uma forma de ler. Ler e reler. Isso é o que mais me interessa neste início de século: o jogo da reescritura.
Como você elegeu os livros a serem resenhados? Como elege as suas leituras?
Procurei aliar dois critérios: qualidade e representatividade. Selecionei obras de autores novos e também de consagrados. A idéia foi recortar, de um vasto panorama, aqueles livros que pudessem servir de mapa para o leitor interessado em saber a quantas anda nossa ficção hoje. Para isso, não levei em conta apelos meramente midiáticos ou o "nome" do autor, mas suas qualidades literárias e sua capacidade de representar esta ou aquela vertente. Quanto às minhas leituras particulares, gosto especialmente de certa ficção produzida no campo da fantasia, daí adorar, por exemplo, o fantástico. Também gosto muito de romance policial e até me arrisquei a escrever um, "O campeonato". E muitas vezes leio algo que não tem nada a ver com isso, levado por sugestões de amigos ou por puro acaso (o que é muito bom).




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